quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Aspectos sociológicos do trabalho da manicure

Aspectos sociológicos do trabalho da manicure

Arquivo pessoal: Juliana Andrade

Premiada no Canadá, socióloga mostra as diferentes interfaces do trabalho da manicure

Por ACS/A.R. em 12/02/2014
Legenda: Posto de trabalho da manicure
Compreender as diferentes faces do trabalho da manicure, com enfoque na interação pessoal foi a principal razão que moveu Juliana Andrade Oliveira, socióloga da Fundacentro a realizar estudo na Universidade de Quebec, Canadá, como parte do estágio de doutorado, no período de agosto de 2012 a julho de 2013, sob co-orientação do Prof. Dr. Angelo Soares.
No estudo, considerado pioneiro tanto no Canadá quanto no Brasil , Juliana pontua aspectos voltados para as relações interpessoais no ambiente de trabalho (manicure X manicure) e a relação da manicure com a cliente na sua conciliação entre a gestão das emoções e a execução do trabalho minucioso nas unhas.
A socióloga explica ainda que no Brasil há uma maior relação de servilidade entre manicures e clientes com a cliente no comando da situação. Com isso, a manicure precisa colocar seu comportamento também a serviço da cliente, e não somente seu trabalho nas unhas. Essa situação é amenizada pelas manicures autônomas, que podem escolher a cliente, por uma relação de afinidade. Já nos salões, a profissional não tem o direito de escolher, apenas a realizar a sua função.
Em plena expansão, a cada dia surgem no Brasil mais e mais institutos de beleza, ou simplesmente salões que são criados como forma de atrair o público feminino em busca da transformação corporal e da melhoria visual. No entanto, Juliana destaca que não se tem imagem da manicure como trabalhadora fazendo com que a profissão seja muito estigmatizada e as manicures negligenciadas do ponto de vista social.
Não há exigência legal de qualificação adequada para exercer a profissão. Na maioria dos casos, são mulheres que aprenderam o ofício sozinhas ou com algum ente da família, e que exercem a função para o seu próprio sustento e para o sustento da família, predominantemente das classes C, D e E. Parte delas trabalha e estuda para concluir um curso de qualificação e, assim, conseguir emprego em melhores salões de beleza. Mas, segundo a socióloga, a ascensão na profissão em geral se dá quando a manicure monta o seu próprio salão.
Na pesquisa conduzida por Juliana, foram entrevistadas 12 mulheres no Brasil (estado de SP), 3 proprietários de salão e 1 proprietário de escola de formação de manicure. No Canadá, foram entrevistadas 4 brasileiras e 2 vietnamitas, além da observação do trabalho em 12 salões de beleza. A pesquisa mostra manicures solteiras jovens tentando pagar faculdade, casadas com filhos e solteiras com filhos. Apesar do perfil variado, o que há em comum é que sustentam famílias com essa profissão como ocupação principal. A metodologia utilizada pela socióloga no Canadá para entrevistar as profissionais foi postar uma mensagem no Facebook contando sobre a realização da pesquisa. A partir daí, algumas pessoas se interessaram e concederam a entrevista.
A tese de doutorado de Juliana será finalizada no primeiro semestre de 2014. Ainda com o título provisório, a servidora está sendo orientada pela Profa. Dra. Maria Helena Oliva Augusto da Faculdade de Filosofia Letras e Ciencias Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), Programa de Pós-Graduação em Sociologia.
A pesquisa foi publicada no site canadense Aquarelamagazine.com e também no site do Centro de Estudos e Pesquisas sobre o Brasil, da UQAM.
Os riscos da profissão
Aparentemente, a profissão de manicure pode parecer simples. Entretanto, são vários os riscos presentes no ambiente de trabalho. Entre os riscos químicos estão os produtos presentes na fabricação de esmaltes, como a acetona e outros solventes, que quando em contato freqüente na pele podem causar dermatite e alergias. Há riscos biológicos relacionados às doenças infecciosas principalmente hepatites do tipo A, B e C, AIDS, além dos fungos e micoses contraídos por lixas e alicates.
Os riscos não param por aqui. As principais queixas das manicures estão voltadas para as questões posturais e também pelo emocional. A ocorrência de depressão é quase duas vezes maior entre os profissionais do salão de beleza do que na população em geral, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), 2008, pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Relações de trabalho
A grande maioria das manicures não é assalariada, mas sim comissionada. Elas exercem em média 12 horas de trabalho/dia e em muitos salões, são obrigadas a ter o seu próprio material de trabalho.
A socióloga observa que flexibilizar o trabalho dessa forma acaba trazendo maior competitividade entre as manicures pelo simples fato de serem autônomas. Como resultado, não conseguem trabalhar no coletivo. Além disso, muitas dessas profissionais são registradas como auxiliares e outras nem mesmo possuem registro em carteira.
A socióloga sustenta que no caso das manicures ocorre uma “formalização simulada”: a manicure tem o registro formal na sua carteira de trabalho como empregada do salão, mas na realidade não possui nenhuma das proteções sociais garantidas pela CLT. Quando fica doente e precisa faltar ao trabalho, perde o ganho daquele dia. Não tem direito à licença médica, e é ela mesma que paga a contraparte do salão para ter FGTS.
O que diz o Sindicato
Mariazinha, ou Maria dos Anjos Mesquita, presidente do Sindebeleza, Sindicato de Beleza do estado de SP, observa que a Lei no. 12.592, de 18 de janeiro de 2012 foi de grande importância para o segmento da beleza. Contudo, a Lei não é especifica para as manicures, mas aos profissionais de salões.
Para a líder sindicalista, além dos problemas de saúde, como a LER, dores na coluna e o descumprimento das normas da ANVISA no que se refere ao uso de material descartável e a utilização das autoclaves para esterilização de equipamentos, falta conscientização por parte do patronato em promover a segurança e saúde no ambiente de trabalho e registrar as manicures em carteira para que possam ter o vinculo empregatício. “Em todo o Brasil se chegarmos a 30% o número de registro em carteira, é muito”, ressalta Mariazinha.

Legislação
Em agosto de 2013, foi criado o Projeto de Lei Complementar 255/13, que se aprovado pela Câmara poderá modificar o vínculo empregatício de muitas manicures. No “projeto salão parceiro”, a proposta é que todos os profissionais de beleza passem a ser registrados como parceiros, ou prestadores de serviço. Juliana destaca que a elaboração do projeto deve levar em conta a existência da “formalização simulada” para evitar que manicures que trabalhem em horários e regras estipuladas pelo salão sejam consideradas “parceiras”.
Há também as Normas Regulamentadoras 17 e 32 (Ergonomia e Saúde), que se aplicam aos ambientes de trabalho da manicure, assim como a Norma Regulamentadora 15 (Riscos Químicos) e o Guia da Covisa-Manual de Normas e Procedimentos.
Segundo Juliana, vários artigos internacionais recomendam melhorar a ventilação dos salões de beleza em virtude da evaporação dos fortes produtos químicos utilizados. No caso da manicure, um ventilador pequeno em cada mesa é importante na aplicação de unhas postiças. Além disso, recomenda-se iluminação individual adicional, o uso de luvas e máscaras.
A NIOSH (The National Institute for Occupational Safety and Health), órgão americano, em uma de suas normas, recomenda o uso de ventilador individual (um em cada mesinha de trabalho) e o uso de máscaras. A socióloga também recomenda que cada cliente tenha seu alicate (já afiado) e lixa de unha, evitando riscos de compartilhamento. (Fonte: FUNDACENTRO)

Nenhum comentário:

Postar um comentário